Casais podem afastar a Súmula 377 do STF

De acordo com o enunciado nº 377 de Súmula de Jurisprudência predominante editada pelo Supremo Tribunal Federal: “No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento.”

Atualmente, prevalece o entendimento de que essa comunicação refere-se aos bens adquiridos onerosamente na constância do casamento (ou da união estável), desde que comprovado o esforço comum para sua aquisição.

Deste modo, ainda que ao casamento ou à união estável seja aplicado o regime legal da separação de bens, seria em tese possível a comunicação de aquestos, ou seja, a formação de um patrimônio comum do casal e, portanto, passível de partilha em caso de separação ou divórcio e de apuração de meação em caso de falecimento de um dos cônjuges ou companheiros. 

A doutrina já defendia a possibilidade de afastamento da aplicação da Súmula nº 377 do STF, por pacto antenupcial.

De acordo com o tabelião Gustavo Dal Molin de Oliveira: 

Quando obrigatório o regime da separação de bens, por força do artigo 1.641 do Código Civil, o casal até poderá lavrar um pacto antenupcial, embora não tenha a faculdade de optar pelos demais regimes de bens: comunhão universal de bens, comunhão parcial de bens ou participação final nos aquestos. O que existe é a possibilidade de celebração de pacto antenupcial para estipulação, no âmbito do regime legal da separação de bens, do afastamento contratual da incidência da Súmula nº 377 do Supremo Tribunal Federal.
Ressalta-se que não se trata de substituir o regime de separação obrigatória pelo regime de separação de bens total ou convencional – efetivamente inadmissível – dada a diversidade de regramentos entre ambos; mas da faculdade conferida aos nubentes de manter o regime de separação obrigatória, vigente em todos os seus termos, com o reforço protetivo de incomunicabilidade dos aquestos definida por pacto antenupcial.

Esse entendimento foi confirmado em recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, assim ementado:

RECURSO ESPECIAL. UNIÃO ESTÁVEL SOB O REGIME DA SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS. COMPANHEIRO MAIOR DE 70 ANOS NA OCASIÃO EM QUE FIRMOU ESCRITURA PÚBLICA. PACTO ANTENUPCIAL AFASTANDO A INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 377 DO STF, IMPEDINDO A COMUNHÃO DOS AQUESTOS ADQUIRIDOS ONEROSAMENTE NA CONSTÂNCIA DA CONVIVÊNCIA. POSSIBILIDADE. MEAÇÃO DE BENS DA COMPANHEIRA. INOCORRÊNCIA. SUCESSÃO DE BENS.
COMPANHEIRA NA CONDIÇÃO DE HERDEIRA. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE REMOÇÃO DELA DA INVENTARIANÇA.
1. O pacto antenupcial e o contrato de convivência definem as regras econômicas que irão reger o patrimônio daquela unidade familiar, formando o estatuto patrimonial – regime de bens – do casamento ou da união estável, cuja regência se iniciará, sucessivamente, na data da celebração do matrimônio ou no momento da demonstração empírica do preenchimento dos requisitos da união estável (CC, art. 1.723).
2. O Código Civil, em exceção à autonomia privada, também restringe a liberdade de escolha do regime patrimonial aos nubentes em certas circunstâncias, reputadas pelo legislador como essenciais à proteção de determinadas pessoas ou situações e que foram dispostas no art.
1.641 do Código Civil, como sói ser o regime da separação obrigatória da pessoa maior de setenta antos (inciso II).
3. “A ratio legis foi a de proteger o idoso e seus herdeiros necessários dos casamentos realizados por interesse estritamente econômico, evitando que este seja o principal fator a mover o consorte para o enlace” (REsp 1689152/SC, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 24/10/2017, DJe 22/11/2017).
4. Firmou o STJ o entendimento de que, “por força do art. 258, § único, inciso II, do Código Civil de 1916 (equivalente, em parte, ao art. 1.641, inciso II, do Código Civil de 2002), ao casamento de sexagenário, se homem, ou cinquentenária, se mulher, é imposto o regime de separação obrigatória de bens. Por esse motivo, às uniões estáveis é aplicável a mesma regra, impondo-se seja observado o regime de separação obrigatória, sendo o homem maior de sessenta anos ou mulher maior de cinquenta” (REsp 646.259/RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 22/06/2010, DJe 24/08/2010).
5. A Segunda Seção do STJ, em releitura da antiga Súmula n. 377/STF, decidiu que, “no regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento, desde que comprovado o esforço comum para sua aquisição” EREsp 1.623.858/MG, Rel. Ministro Lázaro Guimarães (Desembargador convocado do TRF 5ª região), Segunda Seção, julgado em 23/05/2018, DJe 30/05/2018), ratificando anterior entendimento da Seção com relação à união estável (EREsp 1171820/PR, Rel. Ministro Raul Araújo, Segunda Seção, julgado em 26/08/2015, DJe 21/09/2015).
6. No casamento ou na união estável regidos pelo regime da separação obrigatória de bens, é possível que os nubentes/companheiros, em exercício da autonomia privada, estipulando o que melhor lhes aprouver em relação aos bens futuros, pactuem cláusula mais protetiva ao regime legal, com o afastamento da Súmula n. 377 do STF, impedindo a comunhão dos aquestos.
7. A mens legis do art. 1.641, II, do Código Civil é justamente conferir proteção ao patrimônio do idoso que está casando-se e aos interesses de sua prole, impedindo a comunicação dos aquestos. Por uma interpretação teleológica da norma, é possível que o pacto antenupcial venha a estabelecer cláusula ainda mais protetiva aos bens do nubente septuagenário, preservando o espírito do Código Civil de impedir a comunhão dos bens do ancião. O que não se mostra possível é a vulneração dos ditames do regime restritivo e protetivo, seja afastando a incidência do regime da separação obrigatória, seja adotando pacto que o torne regime mais ampliativo e comunitário em relação aos bens.
8. Na hipótese, o de cujus e a sua companheira celebraram escritura pública de união estável quando o primeiro contava com 77 anos de idade – com observância, portanto, do regime da separação obrigatória de bens -, oportunidade em que as partes, de livre e espontânea vontade, realizaram pacto antenupcial estipulando termos ainda mais protetivos ao enlace, demonstrando o claro intento de não terem os seus bens comunicados, com o afastamento da incidência da Súmula n. 377 do STF. Portanto, não há falar em meação de bens nem em sucessão da companheira (CC, art. 1.829, I).
9. Recurso especial da filha do de cujus a que se dá provimento.
Recurso da ex-companheira desprovido.
(REsp 1922347/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 07/12/2021, DJe 01/02/2022)

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