O que é hipoteca reversa?
Com os avanços da medicina, houve aumento da expectativa de vida da população e aumento progressivo da população idosa tanto nos países desenvolvidos como nos países emergentes economicamente. Dentre os cenários de vulnerabilidade, encontra-se a fragilização da saúde decorrente do envelhecimento.
À medida que as pessoas envelhecem, aumentam os cuidados médicos e as despesas com diversos serviços profissionais, tais como geriatras, fisioterapeutas, enfermeiros, cuidadores de idosos e auxiliares das atividades domésticas. Algumas pessoas desenvolvem, ainda, necessidades especiais de alimentação ou dependência de medicação ou de tratamento médico contínuo, as quais também aumentam as despesas de manutenção dos idosos, justamente na fase da vida em que apresentam situação de maior vulnerabilidade.
Os recursos provenientes de pensões e aposentadorias são fixos, limitados, ao passo em que as despesas são variáveis e crescentes.
Um eventual estado de necessidade decorrente da velhice poderia levar as pessoas a celebrar negócios jurídicos manifestamente prejudiciais, desproporcionais, desequilibrados, em razão da premente necessidade de recursos financeiros, acarretando lesão ao patrimônio por assumir obrigação excessivamente onerosa.
O aumento da expectativa de vida e, por conseguinte, o aumento das despesas pessoais e de saúde decorrentes do próprio envelhecimento, levaram as autoridades a aperfeiçoar as políticas públicas voltadas à terceira idade e a buscar alternativas jurídico-econômicas para complementação da renda das pessoas idosas, a fim de que garantir um envelhecimento saudável, com qualidade de vida e com o maior respeito à dignidade da pessoa.
Nesse cenário, surge a hipoteca reversa, ou hipoteca inversa, como alternativa às opções até então existentes à disposição da população, tais como a hipoteca convencional, a doação com encargo e a constituição de renda.
Com efeito, “la figura de la hipoteca inversa es una alternativa negocial más con la que cuentan nuestros mayores que, proprietarios de una vivienda, reciben una exigua pensión de jubilación que cubre mínimamente sus necesidades, por lo que que pueden, con el fin de lograr un nivel de renta superior al de sus ingresos habituales, convertir el valor de dicho inmueble en una renta periódica sin necesidade de perder el disfrute de aquélla”.[1]
Conforme ensina Celia Martínez Escribano, trata-se de um produto financeiro com certa tradição nos Estados Unidos da América e no Reino Unido, que, em linhas gerais, “es una hipoteca especial sobre la vivienda que se viene denominando hipoteca inversa por correspondencia con la terminología estadounidense (reverse mortgage), aunque las entidades financeiras suelen designarla con otros nombres tal vez más comerciales como ‘complemento hipotecario’, ‘hipoteca pensión’ o ‘pensión hipotecaria’. Pero lo cierto es que su denominación es incorrecta, porque en estos casos no se recibe una renta o pensión, sino un capital, generalmente mediante varias disposiciones periódicas”. [2]
A hipoteca inversa foi introduzida no ordenamento jurídico espanhol por força da Lei 41/2007, com a justificativa de que “hacer líquido el valor de la vivienda mediante productos financieros podría contribuir a paliar uno de los grandes problemas socioeconómicos que tienen España y la mayoría de países desarrollados: la satisfacción del incremento de las necesidades de renta durante los últimos años de la vida. La hipoteca inversa regulada en esta Ley se define como un préstamo o crédito hipotecario del que el propietario de la vivienda realiza disposiciones, normalmente periódicas, aunque la disposición pueda ser de una sola vez, hasta un importe máximo determinado por un porcentaje del valor de tasación en el momento de la constitución”. [3]
A grosso modo, a hipoteca inversa funciona de maneira oposta à hipoteca convencional. Na hipoteca convencional, o credor empresta uma quantia em dinheiro ao devedor, que obriga-se a pagar o valor emprestado e os juros decorrentes da operação em prestações periódicas, além de constituir hipoteca sobre um bem imóvel, como forma de garantia do adimplemento da obrigação. Na hipoteca inversa, a hipoteca é constituída para garantir a devolução futura da totalidade da quantia em dinheiro que o credor hipotecário se obriga a entregar ao devedor.
A dinâmica da hipoteca inversa é explicada por Celia Martínez Escribano: “Es decir, esta hipoteca funciona ‘a la inversa’ de la hipoteca ordinaria en cuanto que quien entrega cantidades aplazadas, generalmente de forma mensual, es el acreedor hipotecario, y el deudor no tiene que devolver en vida el préstamo, sino que será tras su fallecimiento cuando resulten exigibles las cantidades debidas. En consecuencia, en lugar de irse disminuyendo la deuda con el transcurso del tiempo, cada vez es mayor la cantidad que se debe. Como garantía del cumplimiento, se constituye una hipoteca sobre la vivienda del deudor, quien conservará durante todo el tiempo hasta el vencimiento del préstamo la titularidad sobre la misma con el gravamen de la hipoteca. Precisamente el hecho de conservar la propriedad de la vivienda durante toda su vida, sin riesgo de perderla ni siquiera por una ejecución hipotecaria, dado que hasta su fallecimiento no es exigible la devolución del préstamo, es lo que convierte a la hipoteca inversa en especialmente adecuada para dar respuesta a los problemas de loquidez de las personas que, por haber alcanzado la edad de jubilación, perciben unos ingresos bastante reducidos. Las cantidades que les entrega la entidad financeira sirven de complemento a su pensión, y ellos no tienen que preocuparse por la devolución de las cantidades, lo que, por otra parte, y habida cuenta de su generalmente exigua pensión, no podrían afrontar en la mayoría de los casos”.[4]
Ao tratar das características peculiares dessa garantia, Inmaculada Vivas-Tesón afirma que “la hipoteca inversa es un préstamo hipotecario especial mediante el cual no se pagan cuotas, y, al contrario, se cobra mensualmente una renta periódica o única (cuyo importe depende de varios factores, como el de la vivienda; la edad de la persona que contrata el préstamo y la de su conyuge; la elección que se haga de recibir una renta vitalicia o únicamente por un periodo determinado, etc), sin perder la propriedad de la vivienda. Esencialmente, el proprietario de vivienda pide prestado fondos contra el valor de su vivienda habitual”. [5]
Dentre as vantagens da hipoteca inversa, estão a solução para um problema financeiro, mediante complementação da renda com os aportes periódicos que serão feitos pelo credor hipotecário; e a tranquilidade de preservar sua habitação por toda a vida, sem correr o risco de sofrer a expropriação de seu bem imóvel residencial por força de uma execução hipotecária motivada pelo inadimplemento, caso viesse a optar pela hipoteca convencional em garantia de um empréstimo bancário. [6]
Conforme lição de Marco Aurélio Bezerra de Melo: Tramita no Congresso Nacional o PLS 52/2018, que acrescenta o Capítulo II-B à Lei 9.514/1997 para dispor sobre a hipoteca reversa de coisa imóvel, de autoria do Senador Paulo Bauer, e que, na realidade, cuida, a nosso ver, de um novo instituto que seria a alienação fiduciária em garantia reversa, não só porque altera a lei de alienação fiduciária de imóvel, mas também porque o art. 33-G da lei projetada prescreve que “a hipoteca reversa regulada por esta lei é o negócio jurídico pelo qual o credor hipotecário reverso, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao devedor hipotecário reverso da propriedade resolúvel de coisa imóvel”. O autor sustenta que, resolvidas questões pontuais no projeto de lei, “o instituto pode ser de grande valia para atribuir ao idoso maior independência financeira e, por conseguinte, uma vida com mais qualidade e dignidade”. [7]
O Projeto de Lei do Senado nº 52/2018 pode ser acessado em <https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/132282>.
Não é fora de propósito assinalar que, como todo e qualquer produto financeiro, a contratação da hipoteca inversa com alguma instituição bancária ou financeira envolve uma minuciosa análise da relação de custo e benefício, além da comparação com as vantagens e desvantagens de outras operações que permitam a capitalização de pessoas de maior idade.
[1] Inmaculada Vivas-Tesón. Instrumentos de apoyo para la autonomía existencial y patrimonial de las personas con discapacidad en España, p. 124.
[2] Celia Martínez Escribano. La hipoteca inversa, p. 34.
Marco Aurélio Bezerra de Melo complementa:
A hipoteca reversa é uma modalidade de direito real de garantia, pela qual uma pessoa, em regra, idosa, grava o seu imóvel em favor do credor com o escopo de receber determinada importância em dinheiro, entregue pelo mutuante de uma só vez ou em parcelas periódicas, valor que somente deverá ser quitado após o falecimento ou alienação do imóvel por parte do mutuário.
Essa espécie de hipoteca é utilizada em outros países, por exemplo, nos Estados Unidos, recebendo a denominação de reverse mortgage, e funciona como um produto econômico oferecido pelas instituições financeiras cujo destinatário é a pessoa idosa, a fim de que esta, com o notório aumento da expectativa de vida, reúna condições de extrair do patrimônio imobiliário, eventualmente granjeado, uma liquidez monetária apta a lhe atribuir melhor qualidade de vida, sem que com isso a pessoa tenha que se desfazer do patrimônio em vida.
Disponível em: <http://genjuridico.com.br/2019/03/28/hipoteca-reversa-o-que-e-para-que-serve/>. Acesso a 18 mai 2019.
[3] ESPANHA. Ley 41/2007.
[4] Celia Martínez Escribano. La hipoteca inversa, p. 44-45.
[5] Inmaculada Vivas-Tesón. Instrumentos de apoyo para la autonomía existencial y patrimonial de las personas con discapacidad en España, p. 123.
[6] A propósito de la hipoteca inversa, “así se eliminan los riesgos derivados de la aleatoriedad presente en las otras formas de financiación y que generalmente desembocan en un desequilibrio de las prestaciones desde el punto de vista económico.” (Celia Martínez Escribano. La hipoteca inversa, p. 48-49).
[7] Disponível em: <http://genjuridico.com.br/2019/03/28/hipoteca-reversa-o-que-e-para-que-serve/>. Acesso a 18 mai 2019.